Os textos deste blog não seguem nenhuma motivação ideológica, e não têm compromissos com sentido nem coesão textual.


quarta-feira, 19 de setembro de 2012

não-ser, ou deus

Não-ser - 09/08/2009

Quero viver num deserto árido
Onde não haja esperança
Para que o peso do efêmero,
Da oportunidade perdida: desapareça!
Para que a impossibilidade
se torne conforto.

Por que existir a vontade
se ela se torna minha própria prisão?
Por que ter razão
se ela apenas atesta o ridículo?
Morro na praia!

A aridez é perene. É minha companheira.
Não há movimento: a potência é ato;
Não há erro pois não há tentativa;
Não há falha pois não há exigência;
Não há vida pois não há desejo? Talvez...
Suspendo o juízo.

terça-feira, 10 de julho de 2012

preferi viver.

Onde estava mesmo?Então, cansado de ser ludibriado pelas expectativas irreais que aquela igreja, aquela família, aquele programa de televisão colocava na minha cabeça, descobri que só pensava pela cabeça dos outros... cabeça e fala dos outros. milhões de véus indianos me separavam da realidade. desconfiei de todos, de meu pai, minha mãe, meu cachorro que olhava-me com olhos pidões, desconfiei até daquela figura simpática e excessivamente, neuróticamente bem penteada, mas que nunca estava satisfeita de fato, que aparecia diante de mim todos os dias no espelho, com olhos tão pidões quanto do meu cachorro, fazendo caras e bocas, querendo se transportar do banheiro para um filme de cinema, onde estrelava sempre como galã, bêbado pálido e charmoso, enfim, achava difícil encontrar as razões que me faziam erguer da cama cedo e trabalhar em minha mente, em meu próprio corpo. rasguei tudo isso, como se não houvesse o amanhã, e realmente, descobri depois, não havia. bani aquela figura para o inferno mais profundo de meu subconciente, como lixo ingrato e ignorante, subproduto de uma subcultura usurpada pela ignorância e superficialidade. realizei a fantasia da vergonha de minha infância, quando sentia vontade de rasgar meu próprio rosto quando me sentia envergonhado por ser bonzinho, bonitinho e fofinho. gostaria de que aquela imagem fosse para o inferno, e que surgisse simplesmente o caos. fui e voltei ao inferno. não me lembro direito daqueles dias, além de uma falta de fôlego constante, provocado por excessivos tragos em tudo que achava por minha frente, parei de conversar, pois até mesmo a minha fala não era minha, e só servia para me iludir, e também os outros, de que aquele murmúrio hipócrita era realmente bom, era realmente verdadeiro, era realmente eu. e talvez era. hoje não sei mais direito. existe por acaso produto ou cultura? enganei-me, realmente, um passo em falso, não sabia que por trás daquele ódio e profundo repúdio a mim mesmo existia uma filosofia perene, cristã talvez, ou um instinto primordial, que orientava todos os meus passos. o que buscava eu, era na realidade, a própria realidade, que eu buscava, arranquei em alguns minutos de grave dor de cabeça máscara após máscara, como num grande OM em baixo tom, máscara após máscara, e só o que restou foi o vazio, a mais amorfa substância, que era como um caos que fluía e se agarrava a tudo que passava, um grande ogro pegajoso, que era tudo o que eu era, e nada mais. sem uma máscara, não havia como ser, não havia como falar, não havia como, pois tudo que eu era, era também outro, tudo que era eu era outro e não eu, no entanto, tudo isso que não é-ra é-ra o mais verdadeiro que podia existir dentro deste ser que vos escreve. morrer era também o não ser, mas também ser qualquer coisa, adubo para o solo, merda, húmus, tudo aquilo que devemos comer para não morrer. não há portanto diferença entre a vida e a morte. então pensei, sem usar palavras de fato: "se continuo vivendo, quero então conhecer o outro, pois não há como viver só para mim, sendo que este mim não existe de fato, e a solidão é só a ilusão de um reencontro." algo assim, pensei, e preferi viver.