Os textos deste blog não seguem nenhuma motivação ideológica, e não têm compromissos com sentido nem coesão textual.


segunda-feira, 17 de junho de 2013

O acordar do povo

O acordar do povo





Hoje na marcha, escutei muitas vezes o canto que diz que "o povo acordou". Isso ficou na minha cabeça.. O povo realmente acordou? De que povo a gente estava falando quando gritava isso? Por que por mais que a gente fosse parte do povo brasileiro, com certeza a gente não era todo o povo brasileiro. Quer dizer, tem uma boa parte do povo que não estava na marcha, e nós estávamos gritando que nós éramos o povo brasileiro, naquele momento lá, reivindicando nossos direitos, cansados de toda a injustiça. E de certa forma, isto era verdade. A gente era o povo brasileiro, por que nasceu no Brasil, é resultado do Brasil, e vive o Brasil, ainda que muitas vezes não pareça. Ao mesmo tempo, a gente também é povo de outros povos, de outros países, que de alguma forma também são parte do Brasil.

Isso foi fazendo sentido na minha cabeça, enquanto eu via a marcha sair da praça Sete de Setembro, subir o viaduto da Antônio Carlos, e fez mais sentido ainda quando depois do viaduto eu tive que sair da A.C. e voltar pela outra mão afim de chegar ao meu trampo, e foi quando eu percebi as outras pessoas que observavam, e pude ver a marcha na perspectiva delas... um mendigo que levava praticamente tudo que tinha em uma bike, uma vendedora ambulante na rua, um jovem que também parecia ir ao trabalho... Essas pessoas também eram o povo em uma outra marcha: a que fazemos para sobreviver.. E aquele grito foi ouvido ali da calçada, sai da frente que o povo acordou! E o povo ouviu esse grito! Agora eles não se vêem mais como um povo que dorme, que é enganado... agora eles são um povo acordado, que vai lutar por seus direitos, que vai se ajudar e reinvidicar preços justos de alimento, transporte e moradia... e isso quem contou pra eles, foi aquele povo que passou ali na Antônio Carlos marchando...



Não ouso dizer que alguém de fato esteja acordado, mas sim que estamos acordando, e é preciso que a gente se cutuque, que se ajude a manter-se acordada. É preciso se preocupar com que o resto da gente, que não estava na marcha, que talvez não leu os mesmos feeds do Facebook, vai tirar de nossas atitudes. E isto não significa que temos que fazer algo que gostem, ou aprovem, mas algo que mostre uma atitude consciente de combate e resistência às opressões diárias que a classe trabalhadora sofre no seu dia a dia, e que nós, enquanto povo brasileiro, também sentimos. Estou dizendo que com esta atitude cada um de nós pode mostrar ao povo, que enquanto estudantes e profissionais das mais diversas áreas, de ciências humanas às exatas, da engenharia até o mais simples trabalho de escritório, não desprezamos e fingimos não ver os moradores de rua que são discriminados por não ter lugar onde morar, os profissionais liberais e vendedoras ambulantes, que tem seu lugar e direito de exercer a profissão negados, os que são considerados doentes mentais e são enclausurados em manicômios, os que sofrem preconceito e violência por sua sexualidade, os usuários de crack que são assassinados e internados contra sua vontade no processo de higienização social, a população negra que sofre com o racismo e genocídio pelo simples fato de sua cor, as mulheres que são reprimidas por lutar por sua liberdade e igualdade civil, e que por fim, não nos desprezamos também enquanto trabalhadores e cidadãos, que utilizamos de nossa capacidade de usar as tecnologias sociais da internet, e nos articularmos e organizarmos-nos em manifestações políticas, usando de nosso tempo livre para protestar pelos direitos humanos de todos à quem isto têm sido negado, e mostrar assim e de diversas outras formas, que não só estamos ao lado do povo, mas também somos parte dele.


O Facebook nos mostrou que temos uma mensagem comum a passar para todas as pessoas, do Brasil e do mundo, a de que nós estamos dispostos a lutar por nossos direitos e liberdades. E isto significa também, saber que cada um de nós é mais do que uma história em particular, mas faz parte de uma narrativa mais ampla e geral, que constitui um povo. Vivemos em um mundo de diversidade e globalização, e quando nos manifestamos publicamente na cidade, estamos falando a uma diversidade de povos, a diversas gerações diferentes, e que participam da constituição do povo brasileiro. A manifestação é um meio de falar com todo o povo, e é por isso que os governantes, corporativistas, ruralistas, etc, estão loucos e tentam o tempo inteiro desqualifica-la na TV. É como apontar para os mais de 20 mil manifestantes e dizer, estão loucos! Mas aquilo ali é nossa fala legítima, enquanto povo que luta por si mesmo, e é por isso que temos que nos esforçar para que nosso objetivo ali tenha em vista sempre o bem do povo, e que isto não se perca no meio dos confrontos que já vieram e virão.